"Ainda que esse eclipse cultural tenha sido
praticamente completo, o processo não se deu de maneira instantânea. Surgido a
partir do século IX, como resultado da assimilação do latim vulgar falado no
noroeste peninsular, com aportes lexicais celtas e germânicos, o galaico
ocidental – ou galego – viveu uma situação de normalização linguística por
cerca de 700 anos. Como era natural, com o tempo ocorreu um progressivo
distanciamento dos falantes do novo romance com respeito ao latim, de tal modo
que até os escrivães passaram a experimentar dificuldades para a correta
utilização do latim, transcrevendo cada vez mais em seus escritos palavras e
estruturas linguísticas próprias do galego. Assim, por conta dos problemas de
compreensão do latim, o galego se viu convertido, entre os séculos XII e XIII,
na língua da escrita, primeiramente em documentos privados, mas logo em seguida
também em documentos públicos. Além disso, simultaneamente, o jovem idioma se
tornou o canal da emergente literatura trovadoresca, e, com a independência de
Portugal, converteu-se na língua oficial do novo Estado, vindo a ser mais tarde
conhecido internacionalmente como português. Por outro lado, ao norte do Minho,
não obstante a perda da autonomia política, até entrado o século XV, boa parte
da documentação ainda é redigida exclusivamente em galego. No entanto, em bem
pouco tempo, todo este amplo e complexo sistema literário jazerá desmantelado,
esquecido, ignorado – jogado às traças de velhos arquivos e emboloradas
bibliotecas de paços e mosteiros. Como isto foi possível?"
Otto Leopoldo Winck
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