terça-feira, 18 de agosto de 2015

Pensei em Dora

Bárbara Lia

Pensei em Dora, que atirou-se nos trilhos de trem da estação de metrô Charlottenburg, em Berlim Ocidental. Banida, exilada, e pensei na verve literária, os revolucionários, manifestantes, os "terroristas" eram mentes pensantes, e por um sonho utópico, morreram, incinerados em suas almas, contra todas as possibilidades, Dora escreveu - “Foram intermináveis dias de Sodoma. Me pisaram, cuspiram, me despedaçaram em mil cacos. Me violentaram nos meus cantos mais íntimos. Foi um tempo sem sorrisos. Um tempo de esgares, de gritos sufocados, um grito no escuro”.

Pensei nas - Moças de Minas - que me fizeram chorar noites a fio quando li o livro de Luiz Manfredini. Os alicates torcendo seus mamilos, as baratas colocadas em suas vaginas, os estupros, a aniquilação, o grito.
Pensei em Iara, bela Iara, Iara amada de Lamarca, que puxou o fio para um país mais justo e foi aniquilada friamente, em um lugar tão longe das horas resolutas, longe de São Paulo, enfurnada no labirinto. O homem pisando na lua, e ela no espelho quebrado, onde tantos foram abandonados, acossados, fuzilados.
Pensei em Sonia que era a amada e na mãe que era guerreira, pensei em Angels, de Stuart, o corpo ralado no pátio, e a fumaça tóxica na boca.

Eram tantas mulheres e eu penso nelas, e nem preciso evocar a DIlma, e nem precisa. A Vera paralisada por eletrochoques, as mães no corredor polonês, e crianças ultrajadas, sim...

Bateu uma tristeza do tamanho da Pátria... Bateu tão fundo, e esta coisa vai corroendo, e vai minando qualquer esperança, e todo sentido vai desabando... A ignorância diz que deviam ter matado todos em 1964. Por Deus, os anos foram todos de extermínio. Esta coisa tão patética e incoerente, de quem pensa a ditadura como um dia, um mês, um ano em 1964 e nem sabe de Tito e sua dor em Fleur, de quando lhe doía saber que na França, flor lembrava Fleury. Todos os ossos da alma quebrados... E então, enforcar Herzog não bastou, insulto grotesco a quem foi jornalista como se deve ser. Insulto, escárnio.

Eu estou triste, e até poderia perdoar tanta ignorância sobre a própria Pátria, mas, é só o estandarte do bloco do fascismo. Era só a estampa do pensamento de tantos, então, eu estou triste e me permito ficar triste, e vou continuar um tempo ainda, imensamente triste.

e só falei de algumas mulheres, é pouco mais de quatrocentas vidas?

este ultraje não devia passar em branco, no entanto, fica assim, nada acontece, além desta tristeza que persiste...
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Quando eu estudei - sim - era tudo calado, e criaram matérias como OSPB e aquelas tentativas de imprimir uma moral cívica, enquanto escondiam o que acontecia...

Dei aula de História, e é tema nos últimos anos do Ensino Fundamental e Ensino Média. Quem Estuda o Século XX passa por todas estas revoluções... As Guerras Mundiais, a Revolução Cubana e nosso governo ditatorial...


 Bárbara Lia

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