Sabe quando a chuva cai lá fora e cada pingo reboa em nós
como um látego? Pois está assim hoje. Acordei, mijei e vim me instalar na
janela, com meu copo de conhaque e meu cigarro. Nenhuma pessoa na rua. Carros
ressoam ao longe. E eu me pergunto: em qual esquina da vida eu peguei a via
errada? Talvez desde o começo. Talvez desde sempre. Agora é tarde para
corrigir. Só me resta escrever, proceder ao inventário de meus erros. Vou sair
daqui, abrir o computador e digitar assim: Sabe quando a chuva cai lá fora e
cada pingo reboa em nós como um látego? Pode ser um bom começo de romance. Ou
pode ser nada. É mais provável que não seja nada, não dê em nada. Hoje não acredito
em nada. Nem na literatura, que já foi minha mais fervorosa religião. Hoje acho
que só acredito nessa chuva. Para falar a verdade, acho que sempre choveu na
minha vida. E eu sempre estive na janela, bebendo, fumando e esperando ninguém.
Se você gosta de romances educativos, vibrantes, cheios de sexo e porrada, não
abra este livro, leitor hipócrita. Aqui você não vai encontrar nada que
preenche esses romances da moda. Aqui você só vai encontrar um cara de meia
idade na janela, com um copo e um cigarro. E chuva. Muita chuva. Pois este
romance ambienta-se em Curitiba. E em Curitiba não tem mar, não tem rio, só tem
chuva. E agora este cara, na janela, com cara de tédio. Pense bem se você quer
continuar lendo esta joça.
Otto Leopoldo Winck
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