domingo, 17 de agosto de 2014

o que eu diria a atriz, assim de última hora


o que eu diria a atriz, assim de última hora
em poucas e sôfregas palavras

você é indescritível. poucas vezes vi algo igual. preciso do seu olho, ele muda de cor conforme diz o texto. preciso o que está por trás dele. a platéia quer conhecer o estômago, o fígado, o cruel e subjetivo que vivemos a esconder. o cérebro faz parte das entranhas. é o momento de agir o seu ser que jamais antes. cada ação estréia o inédito. nada aconteceu antes no mundo. nem uma máquina de ressonância saberia revelar o que você está revelando. maravilhas conforme a peça avança. dê as mãos dos olhos à platéia. e os braços da voz. exponha cada detalhe do processo a cada vez que o diafragma, os alvéolos. dê vazão ao debaixo dos teus pés, os anjos que ficam por lá batendo pra que o palco não seja precipício. filtro, o seu corpo. corrente sanguínea, o que o inferno reconhecido na beleza. você se alimentou bem? não tenha dó de nada de si mesma. também é escuridão na poltrona marcada. mastigue a platéia que mastiga a cena, ossos não passem de papinha de neném. sem escafandro ou bóia salva-vidas vá no sangue da platéia emancipada. cada um mãe desse momento. memórias distintas e nos mesmos antepassados. há um pacto irretocável, indestrutível, absurdoplausível, chamados do selvagem. a peça depende mais que. o teatro está flutuando de tanto que a terra se abriu. anjos se proliferam. você tem o ser nas costas. proteja os calcanhares. a fala é fêmea.

Luiz Felipe Leprevost

Nenhum comentário: