terça-feira, 30 de dezembro de 2014

Confessionário


- Padre, preciso me confessar!
- Claro minha filha, venha comigo.
- Cometi diversos crimes contra a humanidade e acho que preciso ser julgada por isso.
- Entendo. Mas que tipo de crime?
- Vou começar pelo principal e que me deixa mais enojada. Matei alguém.
- Sim! E quando foi isso?
- Há muitos anos atrás, quando eu ainda era jovem.
- E como fez isso?
- Bem, comecei aos poucos. Fui matando devagar. Fiz sofrer primeiro.
- E esta pessoa havia feito algo para você?
- Não! Este é o problema. Ela era livre, tinha sonhos e ambições. Mas tive inveja da maneira como ela enxergava a vida e dos planos que fazia.
Comecei a achar que ela precisava ser mais realista e deixar de sonhar. Em determinado momento eu disse coisas horríveis para ela.
- E ela?
- Ela tentou se defender, dizendo que o mundo precisava de mais pessoas como ela e que eu não tinha o direito de interferir.
Disse que gostaria de viver intensamente e que eu precisava de ajuda por ser tão amarga.
- Foi então que a matou?
- Não! Tentei, mas não consegui. Mas com o passar do tempo, conheci muitas pessoas como eu.
Pessoas que não compreendiam o que ela dizia e pensava e acabaram me ajudando a eliminá-la por completo.
- Então você não fez isso sozinha.
- Na verdade fiz. Eu poderia ter sido contra as opiniões das pessoas. Poderia ter entendido o lado dela. Não fiz por que não quis.
- E por que não o fez?
- Ora, se eu fosse contra... eu acabaria como ela.
- Mas você ainda não me disse como fez.
- Matei todos os sonhos dela, todos os planos. Destruí os ideais, as amizades. Ela entrou em depressão profunda.
Não tinha mais vontade de viver. Até que certo dia ela desapareceu. Ninguém mais ouviu falar dela.
Me arrependo pois agora mais velha, percebo que ela estava certa. Eu deveria ser como ela. Queria ter a coragem dela.
- Você disse que ela desapareceu. Como sabe que ela morreu de fato?
- Porque ela era eu.

Lasombra Ribeiro 

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