De Mara Paulina Arruda
Atendeu o interfone. Ouviu a voz Dele contando que tinha chegado
de viagem. Afobado contava que tinha encontrado uma cadernetinha antiga de sua
avó. A cadernetinha, de capa preta, com receitas culinárias escritas em alemão.
A avó dona desta preciosidade fazia uma geléia que era o supra-sumo da
perfeição culinária. Muitas vezes, Ele, quando criança, assistiu
a feitura desta geléia. Eles, a panela no fogo, o doce sendo
preparado até ficar em ponto de fio e o aroma em toda casa; lembrou-se que viu
na ponta dos pés o borbulharem das cascas de laranja com açúcar. O tempo
passou. Ele cresceu. Foi estudar em outro estado e agora já formado encontrou a
caderneta numa caixa que sua mãe guardava dentro de um baú e que iria pôr no
lixo. Que saudades! O folhear da caderneta desencadeou as lembranças de uma
infância saudosa e o mesmo aroma da geléia de laranja de quando era pequeno que
viu os olhos da avó olhar os seus. Ai nesse folhear de caderno ele lembrou-se
dela e de um namorico que tiveram na adolescência. Silenciou por alguns
instantes. Depois disse que precisariam conversar sobre o quanto foi difícil a
ausência dela, no tempo de estudo, mas que essa conversa ficaria para mais
tarde e concluiu que alguém havia lhe contado que ela tinha virado
pesquisadora. Que por não ser boa cozinheira suas pesquisas estavam centradas
no arqueológico da culinária. Ora! Ele dizia não acreditar nisso.
Ela, no décimo segundo andar e Ele, na calçada, ao lado do
portão do prédio conversaram por mais de 40 minutos através do interfone.
Conversa vai conversa vem havia para Ela uma dúvida: O que eu vou fazer com
essa caderneta se nem uma vírgula de alemão eu sei? Eis a questão,
prontificou-se Ele: deixe-me ir até o seu apartamento e você conhecerá compotas
de pêssegos, figos e essa geléia que te falei sendo preparadas por mim! Ela
largou o fone no ar descendo num pé só para buscá-lo no portão.
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